A Vida dos Bnei Noach - Por João Alves Correia

Há cerca de 22 anos, tive meu primeiro contato real com o mundo judaico e com o pensamento religioso e filosófico do povo de Israel. Isso foi num dia frio de inverno curitibano, na agora desativada Sinagoga Francisco Frischmann, com o R. Dr. Simón Mogilevsky.
De lá para cá, muita coisa mudou, e aos poucos, por meio de mais aprofundamento nos estudos das sheva mitzvot Bnei Noach (sete mandamentos dos Filhos de Noach), ganhei alguma experiência, e assim, passei a reunir em torno de mim um certo número de amigos, formando um grupo de estudos das Leis Universais sob a égide dos grandes legisladores, comentaristas e pensadores judeus. Desta forma, e mais ou menos como um ‘irmão mais velho’, passei a auxiliá-los nesta elevada senda que, certamente se mostrou libertadora para muitos que sempre se sentiram oprimidos por sistemas religiosos e crenças desvinculadas do monoteísmo puro.
Muito tempo depois daqueles primeiros anos, sob muitas dificuldades e até mesmo acirrada oposição daqueles que infelizmente ainda relegam os Bnei Noach a uma posição de párias, aqui estamos nós, firmes, levando adiante um trabalho de conscientização monoteísta intrínseca e firmemente apoiada pela história e tradição do povo judeu.
Semanalmente, em geral, aos sábados, nos reunimos numa plataforma digital a fim de avançarmos nos estudos da Torá e na tradição monoteísta, sempre fazendo questão de usar as fontes em sua pristina natureza e origem, permitindo aos nossos amigos comentários e observações que são sempre (democraticamente) bem-vindos e considerados. Durante a semana, o grupo reúne-se em outra plataforma a fim de ‘dissecarmos’ os estudos do sábado e de tecermos comentários e tratarmos das elucidações necessárias a cada detalhe do que tem sido estudado.
Nossas aulas são todas gravadas em vídeo e disponibilizadas aos membros por meio de uma biblioteca online de mídia, além dos materiais em apostilas eletrônicas (muitos dos quais, inéditos em língua portuguesa) que são traduzidos e disponibilizados aos membros que desejam acompanhar as aulas seguindo o ‘roteiro’ das fontes e da bibliografia.
Estamos neste momento tentando implementar com mais frequência a realização de simpósios multirregionais, sendo que o primeiro deles foi celebrado na cidade de São Paulo, em 2015, o segundo, em Salvador-BA, no ano seguinte, e o último, em 2017, na cidade de Ponta Grossa, PR. Após esses eventos, pareceu ser mais conveniente por questões logísticas e de organização, que nossos simpósios fossem realizados por biênio, e há planos para a convocação de um outro, para meados do próximo ano, provavelmente na cidade de São Luís do Maranhão, com data ainda a ser definida.
Nestes simpósios, distribuímos obrigações e responsabilidades por igual em termos de palestras sobre nossas leis e suas minúcias, além de estudos da Torá (parashá da semana) e apresentações sobre temas diversos relacionados à vida dos Bnei Noach, aquilo que defendemos em termos de conduta ética universal e a aplicação de todas as nossas leis em nossa vida e no meio em que vivemos, etc. Aprendemos também a como nos relacionar corretamente com o mundo judaico e principalmente, a respeitar as distinções que existem entre a prática judaica e a perspectiva Bnei Noach.
Defendemos que os Bnei Noach não devem jamais buscar ‘imitar’ as práticas judaicas pois as mesmas consistem em uma ‘kehuna’, um sacerdócio, que só a eles foi dado e do qual, nós, Bnei Noach, derivamos as prometidas bênçãos a Abraão à todas as nações.
Por outro lado, nossos laços e vínculos com o povo judeu são eternos pois entendemos ter sido um mandamento ordenado a Moisés que Israel instruísse as nações em seus sete princípios, desde o Sinai (Rambam, M.T., Lei dos Reis, 8:10); este nosso vínculo é assim concretizado por meio do uso das fontes judaicas sobre o tema em nossos estudos, incluindo a monumental obra do R. Moshe Weiner, “Sheva Mitzvot Hashem”, obra essa da qual eu pessoalmente estou me empenhando na tradução para a língua portuguesa.
Destes grupos de estudos participam pessoas das mais variadas regiões do país, das mais diversas origens e interesses, porém, todas unidas por um grande desejo de empreender um trabalho de aprimoramento pessoal e comunal, influenciando pessoas para o bem, por meio da instrução e da prática de todo o conjunto das nossas leis, em seus detalhes; acreditamos que o que há de melhor no mundo está no mundo – em toda a Criação, e ao implementarmos esforços para a retificação pessoal, estaremos impactando todo o nosso microcosmo, amigos, família e a sociedade em geral, influenciando os que estão a nossa volta a entenderem que o verdadeiro e autêntico serviço prestado a D’us não é outro senão o serviço prestado ao nosso próximo, imbuindo o mesmo de condições para exalçar-se ao desejável nível de um ser humano ético, sob todos os aspectos. Cremos que assim procedendo, estamos cumprindo o propósito fundamental de nossa existência.
Nossos desafios? São muitos. Primeiramente, nos livrarmos de estereótipos impostos por pessoas que vivem sob a obscuridade da ignorância. Mas há também muitos outros, como conscientizar nossos próprios amigos Bnei Noach de seu papel na construção do mundo – senão do ideal, do que é viável, para o bem e pelo bem. Não há motivo justificável para que o movimento Bnei Noach se sinta prejudicado por não ‘pertencer’ a algo ou a alguma coisa. Na verdade, esta é a nossa essência, sem instituições, sem líderes, sem dogmas e sem nem mesmo uma identificação ‘jurídica’ ou coisa que o valha.
Noach, nosso pai, foi homem justo e temente aos Céus sem tais necessidades. Devemos imitá-lo, nisso acreditamos, sustentando nossa posição por meio das mais abalizadas fontes judaicas que sempre nos garantiram a liberdade de sermos o que somos: pessoas de todas as nações, pessoas livres e de bons costumes cujos destinos estão para sempre vinculados ao do povo judeu, por meio da mesmíssima fé e precisamente da mesma visão de mundo.
Finalmente, para encerrar, seria de muito bom tom com a ideia de resumir o que entendemos como Bnei Noach, que assim o fizéssemos reverberando, em paráfrase, as palavras do Chacham de Livorno, o R. Elie Benamozegh:
“A ‘religião’ da humanidade não é outra, senão aquela praticada pelos Bnei Noach; não que ela haja sido instituída por Noach, mas porque remonta à Aliança de Deus com a humanidade na pessoa deste justo. Eis aí a ‘religião’ conservada por Israel para ser transmitida aos Gentios” (O Santuário Desconhecido, Aimé Pallière -Ed. Bnai Brith)
João Alves Correia
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Para conhecer mais sobre os Bnei Noach, você pode contactar o Sr. João Alves Correia através deste link: https://www.facebook.com/esh.yohanan