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O Que é Gyiur Lechumra?




Recentemente na página de Facebook do blog, publiquei um meme que fiz sobre gyiur lechumra. A reação do público foi variada. Os que sabem ou possuem uma ideia do que é um gyiur lechumra acharam graça da crítica, os que não sabem, reclamaram.



Mas afinal de contas, o que é um gyiur lechumra? Antes de discutir a respeito, é necessário entender este termo em hebraico.



Gyiur Conversão (um processo pelo qual uma pessoa não judia faz, a fim de se tornar parte do povo judeu, recebendo todas as obrigações, responsabilidades, direitos e deveres, aceitando todas as mitzvot, sejam d'Oraita ou de d'rabbanan)



L´Chumra No Brasil usamos a transliteração ‘lechumra’, mas o termo correto consiste em duas palavras: L´Chumra

L: de - Chumra (חומרה): rigor, restrito, uma exigência a mais


Em resumo, a conversão l'chumra é uma conversão de RIGOR.


Ela é feita como uma exigência a mais e somente em CASOS ESPECÍFICOS, casos onde tudo o que separa a pessoa do povo judeu é apenas uma PEQUENA dúvida sobre a judaicidade da pessoa. “Essa pessoa JÁ é judia ou ainda não é?”

Não se preocupem, após explicar a diferença entre gyur normal e o l’chumra, eu darei alguns exemplos que levam uma pessoa a fazer o l’chumra.




QUAL A DIFERENÇA ENTRE GYUR NORMAL E GYIUR L’CHUMRA?



GYIUR NORMAL O processo de gyiur, que eu chamo aqui de ‘gyiur normal’ só para efeito de facilitar o entendimento deste post, é o processo de conversão que a maioria conhece:


uma pessoa não judia se interessa pelo Judaísmo


aí ela procura um rabino, o rabino OBRIGATORIAMENTE tem que “afastar a pessoa com uma mão e trazer para perto com a outra” em média 3 vezes


a pessoa começa a estudar, entra na comunidade, atende serviços religioso, conhece famílias que servirão de “sponsor” (famílias que “adotam” o candidato a conversão, mais ou menos, ensinando a cultura e aspectos da fé judaica de uma forma informal), faz testes de conhecimento frente a um beit din ANTES de se converter (eu fui chamada 5 vezes pelo beit din para testes de conhecimento haláchico…suei frio… uau…pensem no que é PRESSÃO), aí quando o beit din decide que a pessoa está pronta, a data para ir a mikva é marcada


então chega o grande dia da pessoa ir para a mikva e a pessoa encontra o beit din de novo, aí o Av Beit Din (cabeça do beit din, o líder, digamos assim) e qualquer um dos rabinos do beit din que quiser falar, adverte a pessoa sobre os perigos de se tornar judeu, adverte dos riscos, adverte das responsabilidades, faz advertência em cima de advertência, alguns tentam assustar a pessoa com tantos avisos, e perguntam OBRIGATORIAMENTE se a pessoa quer mesmo se converter, alguns rabinos até fazem mais perguntas sobre as intenções da pessoa...


finalmente, se tudo der certo, a pessoa finalmente é enviada para a mikva, onde diz uma bênção, mergulha e sai JUDIA! MAZAL TOV! Bem vindo(a) a tribo!


Fácil, não? ;)


O gyiur normal é fácil de explicar. Agora apertem os cintos e respirem fundo, porque vamos começar a ver o que é um gyiur l’chumra a fundo.





NASCIMENTO E CONVERSÃO

O gyiur l'chumra se aplica quando há uma dúvida de existente judaicidade no nascimento ou em uma prévia conversão.

O beit din não tem certeza se a pessoa nasceu judia ou não.

O beit din não sabe se a conversão prévia que uma pessoa fez é casher ou não, então convertem de novo pra sanar essa dúvida.

Em resumo, é isso.



GYIUR L’CHUMRA – NASCIMENTO = LINHA MATERNA O gyiur l’chumra é feito para a pessoa que SABE que já NASCEU JUDIA, mas lhe falta um único elo DA LINHA MATERNA, lhe falta um único documento para provar que ela é mesmo judia.


Por exemplo:

Suelen tem uma avó MATERNA russa.



A avó materna russa de Suelen nunca participou de comunidades judaicas no Brasil, mas disse a Suelen que ela é judia. A avó de Suelen não possui nenhuma prova documental de sua judaicidade, ou seja, ela não tem uma ketubá (contrato de casamento religioso judaico), não possui registros de atestado de óbitos familiares feitos por organizações judaicas, fotos de túmulos da família em um cemitério judaico, nomes de parentes e/ou amigos judeus que ficaram na Rússia que poderiam confirmar que ela é judia… a avó de Suelen, que chegou ao Brasil apenas com uma pequena muda de roupas e mais nada, não possui nenhuma prova de que é judia e NUNCA se aproximou da comunidade judaica brasileira.


Suelen é judia ou não?


A uma primeira vista, sim. A lei judaica determina que o Judaísmo passa de MÃE para filhos. Se a avó materna de Suelen é judia, logo a mãe de Suelen é judia e logo, Suelen também é judia.


PORÉM… a avó de Suelen não possui provas documentais e nunca conviveu dentro da comunidade judaica brasileira… então… surgem DÚVIDAS.



Dúvida 1 E se o pai da avó de Suelen era judeu, mas a mãe da avó de Suelen NÃO era judia?


Dúvida 2 E se a avó de Suelen foi adotada quando bebê, sendo criada por um casal judeu, mas nunca passou por um processo de conversão quando era criança?


Dúvida 3 E se os pais da avó de Suelen não eram judeus, mas a avó de Suelen admirava tanto

alguns vizinhos que eram judeus que começou a dizer a todos que era judia?

Dúvida 4 E se a avó de Suelen foi criada por avós PATERNOS judeus ou qualquer parente judeu do PAI dela, por motivos de guerra, fuga, etc, e ninguém teria o paradeiro da mãe e nem sabem se a mãe é judia?

Essas são só algumas das várias dúvidas que podem gerar um GYIUR L’CHUMRA para casos onde há dúvida se a pessoa é judia de NASCIMENTO.


Suelen tem um forte histórico familiar que tende a ser judeu de verdade, porém… tudo o que separa Suelen de fazer parte do povo judeu é uma pequena prova documental… sem esse único documento faltante, os Rabinos não podem dizer com certeza que Suelen é judia… e ao mesmo tempo, NÃO podem dizer com certeza que ela não é. Suelen está em um limbo.


Esse caso acima acontece com MUITOS descendentes de russos que residem em Israel.




Exemplo 2 Esse é um exemplo REAL de um jovem árabe que odiava Israel, mas que em vida adulta ouviu da MÃE, que estava para falecer, essas últimas palavras: “Eu sou judia, e você também é judeu. Quando eu era jovem, casei com seu pai muçulmano e nunca contei a ninguém que eu era judia”. O jovem, transtornado, depois de muita reflexão, mudou-se para Israel a fim de viver entre o seu povo, o povo judeu. Chegando lá, descobriu que embora todos se compadecessem dele, ninguém o aceitaria como sendo 100% judeu porque ele não tinha como comprovar a história. Ele, segundo sua mãe, tinha nascido judeu e não precisava de conversão. Mas ao mesmo tempo, como saber se ele estava dizendo a verdade, já que a mãe faleceu sem lhe informar sequer o nome de um parente judeu que pudesse comprovar sua história?

O jovem não podia mais voltar ao vilarejo onde crescera. Antes de sair de lá, ele disse a amigos que era judeu e a partir desse momento, a vida dele estava ameaçada.

Nos dois casos acima, a LINHA MATERNA de ambos os jovens é supostamente judaica. Os dois jovens acreditam piamente que são judeus, mas não podem comprovar.


Com um histórico assim, de LINHA MATERNA AFIRMANDO PIAMENTE QUE É JUDIA, nenhum rabino pode dizer que os jovens não são judeus… e ao mesmo tempo, pela falta de provas, nenhum rabino pode dizer que eles são.


Há uma dúvida. E é aí que entra o gyiur l’chumra, que é feito para sanar dúvidas deste tipo.


Tanto Suelen quanto o jovem criado em um vilarejo árabe precisam passar por um gyiur l'chumra.





GYUR L’CHUMRA – CONVERSÃO ANTERIOR José se converteu com um beit din duvidoso.


A conversão foi as pressas, José não sabia exatamente o que estava fazendo e se converteu mais pela emoção do que pela razão.


O beit din era composto por um rabino, um judeu de atitudes duvidosas e um convertido que só Deus sabe se é shomer Shabat e mitzvot ou não.


José decide sair do Brasil e vai para um país onde há um beit din de conversão admirado por todos, que é indubitavelmente 100% casher, os membros deste beit din estão de acordo com todos os rigores da Lei de Moisés e José entende que se fizer uma segunda conversão com este novo beit din, que é respeitado no mundo todo, ninguém jamais irá ter dúvidas se ele é judeu mesmo ou não. José finalmente sentirá PAZ.


José fala com o rabino da sinagoga mais próxima e diz que já tinha feito uma conversão no Brasil, mas que o beit din era polêmico e pergunta o que fazer.


O rabino leva o caso de José para o beit din respeitado. Eles discutem, entrevistam José, vêem que o conhecimento judaico dele é muito rudimentar, porém, vêem também a sua sinceridade.


E agora? O beit din se pergunta. Mesmo sabendo que o beit din que converteu José no Brasil é polêmico, ninguém pode afirmar com 100% de certeza que o mesmo não foi casher segundo a halacha… mas devido as polêmicas que envolvem os membros deste beit din brasileiro, também não há como afirmar que a conversão de José é casher… José já é judeu ou precisa se converter??????


Há uma dúvida.


E há somente uma maneira de sanar esta dúvida se José JÁ é judeu ou não: através de um gyur l’chumra.



COMO É FEITO O GYIUR L’CHUMRA? Se vocês ainda se lembram, lá em cima expliquei como funciona o gyur normal. O beit din sabe e tem absoluta certeza que a pessoa NÃO é judia. Há várias exigências, os rabinos tentam alertar a pessoa, desencorajam, avisam que é perigoso ser judeu, atrasam um pouco o processo aqui e ali…e finalmente, quando chega o dia da mikva, a pessoa diz uma bênção ao entrar, aí ela mergulha e sai judia. Mazal tov!


O gyiur l’chumra é feito de uma forma diferente.


No gyiur l’chumra, o beit din sabe que há uma grande chance da pessoa JÁ ser judia. Sendo assim, o beit din apenas conversa com a pessoa, NÃO exige cursos e mais cursos, não alerta a pessoa dos perigos de ser judeu, não desencoraja a pessoa, e quando a pessoa entra na mikva, ela mergulha SEM fazer a bênção. Por quê? Para evitar que ela diga uma bênção em vão, no caso dela já ser judia.


O prazo de um gyiur normal NA DIÁSPORA dura em média 2 anos. Um gyiur l’chumra pode durar apenas dias… ou semanas… ou em alguns casos, alguns poucos meses.



GYIUR L’CHUMRA E COHANIM Não é segredo para ninguém que mulheres que se convertem ao Judaísmo não podem se casar com cohanim. Essa é a lei judaica e quem quer se converter ao Judaísmo tem que aceitar as coisas como elas são.


Um dos motivos dessa proibição é que cohanim possuem a função espiritual de servir no Templo, UNINDO o povo e a presença Divina através de rituais que só eles podiam fazer, juntamente com os sacrifícios. É assim que o Judaísmo foi feito.


Sendo que a função do cohen é UNIR, ele tem que viver dentro de um regime onde se sinta 100% unido e conectado ao povo judeu e a presença divina.


Não é segredo para ninguém que nem todas as mulheres que se convertem ao Judaísmo se tornam judias devotas… algumas se arrependem (mesmo na ortodoxia…é raro, mas acontece), algumas podem praticar idolatria escondido dentro de casa, algumas poderiam levar um cohen a praticar idolatria (alguns maridos fazem TUDO por suas esposas, perdem a razão)…enfim… então Hashem decidiu que mulheres que se convertem ao Judaísmo podem se casar com qualquer homem judeu, exceto um que seja cohen.


Ótimo.


E quando a mulher faz um gyiur l’chumra? Ela pode se casar com um cohen? Na verdade… não. Lembrem-se, o gyur l’chumra foi feito porque EXISTIA uma DÚVIDA se tal mulher era mesmo judia… então… no final das contas, seja gyur normal ou l’chumra, o fato é que a pessoa que precisou passar pela mikva é considerada ger ou geyores. E cohanim e geyores não se casam. Dura lex, sed lex. A lei é dura, mas é a lei. E quem quer se converter tem que aceitar TODA a lei, mesmo que só venha a entendê-la depois de anos de estudo.





SOMOS TODOS ANUSSIM? Meu meme irritou a galera que não sabia o que era um gyiur l'chumra. Alguns até pensaram que eu estava tirando o barato de gerim e candidatos a conversão. Well... minha alfinetada foi dirigida àqueles que exigem demais sem saber do que estão falando.


A moda de que “o Brasil é anussim”, promovido por pessoas que DEPENDEM DE QUANTIDADE DE SEGUIDORES PARA SOBREVIVER, mais desinforma do que informa. Essa mora desinforma e ilude.



Há descendentes de cristãos novos no Brasil?

Sim.



Esses descendentes são judeus?

Se não podem comprovar uma LINHA MATERNA JUDAICA ININTERRUPTA, não, esses descendentes hoje, século 21, não são considerados judeus. Caso queiram se converter, terão que fazer um gyiur normal.



Todo mundo que acha que é anussim, realmente o é?

Não. Para uma pessoa ter certeza que descende de judeus da Península Ibérica, ela precisa fazer genealogia documental. Caso queiram se converter, terão que fazer um gyiur normal.


Genealogia genética ajuda a comprovar que uma pessoa descende de bnei anussim?

Depende. Uma genealogia genética pode revelar matches (parentes próximos ou distantes) que saibam da história da família, ou que tenham documentos que podem ligar a pessoa a ascendentes judeus. Caso queiram se converter, terão que fazer um gyiur normal.


Se meu pai mantinha uma tradição judaica, e minha avó me disse que fazia outra tradição judaica, sou judeu?

Não. Caso queiram se converter, terão que fazer um gyiur normal.


Uma pessoa começou a fazer genealogia DOCUMENTAL a fim de ganhar cidadania PORTUGUESA ou ESPANHOLA sem a intenção de se converter ao Judaísmo. Durante as pesquisas, esta pessoa encontrou uma linha judaica materna ininterrupta até o ano de 1620…tal pessoa ficou tão impressionada pela descoberta que decidiu se converter ao Judaísmo. Ela precisa de conversão? Aí depende do beit din. Alguns diriam que não, que a pessoa já é judia e não precisa de conversão. Outros poderiam pedir um gyiur lechumra, porque a mulher de 1620 nasceu em um lar que praticava o cristianismo há quase 200 anos...muita coisa pode ter ocorrido entre 1492 e 1620...uma adoção...um marido judeu que teve uma filha com a empregada não judia e para abafar o caso, a esposa judia perdoou o marido infiel e ambos decidiram criar a menina (que não era judia)...obs: ocorreu um caso assim na casa de Branca Dias...




Uma pessoa começou a fazer genealogia documental e descobriu uma linha judaica materna ininterrupta até ANTES DA EXPULSÃO de judeus da Península Ibérica. Essa pessoa precisa de conversão? Não. Uma mulher que era considerada judia na Espanha ANTES de 1492 e foi forçada a se converter ao cristianismo em 1492, não deixa a menor dúvida, ela nasceu JUDIA e sua descendência FEMININA carregou o Judaísmo por séculos até tempos atuais.

Eu conheço apenas uma pessoa no mundo todo que fez uma descoberta dessas: Genie Milgron - http://www.geniemilgrom.info/home-espanol/




Sendo assim, a maioria esmagadora dos brasileiros que querem um gyiur l’chumra não possuem base para tal exigência.




PARANÓIA Eu, que fiz duas conversões normais, simplesmente não consigo entender a paranóia de tanta gente em querer “pular o muro” e mentir para conseguir um gyiur l'chumra. Mesmo que alguém consiga mentir para os homens, não há como mentir para Deus.


Dá trabalho entrar no Judaísmo legalmente? Sim.


É difícil? Sim.


É impossível? Não. Apenas requer muito esforço, trabalho e força de vontade.


Infelizmente há poucos judeus no Brasil e as comunidades judaicas estão concentradas em RJ e SP. Mas… Hashem sabe da intenção de cada um, e se Ele quiser, Ele abrirá portas, janelas e cercados. A providência divina não possui limites, quando ela começa a agir, pessoas aparecem e nos apresentam a pessoas que podem nos ajudar, nosso cérebro começa a entender melhor certas coisas etc etc etc



Caso alguém perceba que esqueci de comentar algo ou ainda tenha dúvidas sobre a diferença entre gyiur e gyiur l'chumra, meu e-mail é vpjudaica@gmail.com



Ok… como sempre, escrevi pra caramba huahauaua mas tudo bem, como diz o célebre garçom do Chapolim “Estamos aqui pra isso”.



Kol tov,




Esther

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